“Uma eleição define um caráter” escreveu certa vez o sociólogo brasileiro Emir Sader. A reflexão aborda o quanto uma disputa eleitoral revela comportamentos e valores morais. Eleição é relação intrínseca entre candidato e eleitor.
Jacques Lacan, psicanalista francês do século XX e inovador da teoria psicanalítica de Sigmund Freud, desenvolveu uma abordagem em que a política e a psicanálise estão interconectadas.
“A política é uma arena onde as identidades são formadas e os desejos são negociados”, enfatizava Lacan, argumentando em seus seminários que a política é uma forma de linguagem e que o poder é exercido através do discurso. Para os lacanianos, o sujeito é construído através da linguagem e das relações sociais. A política desempenha um papel fundamental nesse processo.
Admiração, preparo, medo, confiança e merecimento são considerados como sentimentos que estão presentes nas visões de mundo dos eleitores brasileiros. Assim sendo, tem-se a hipótese inicial de que eleitores podem verbalizar estes sentimentos em relação a candidatos no contexto eleitoral quando estimulados.
O voto, declarado ou silenciado/silencioso, é a maior expressão e importância do inconsciente na política, uma vez que nossas motivações e crenças políticas são muitas vezes influenciadas por desejos inconscientes e fantasias.
Pouco importa para o inconsciente se a eleição é local ou nacional, mas sim, sempre é (será) universal e fruto de um inconsciente coletivo.
Há tempos cientistas políticos, entre eles o escritor de “Razão e Emoção no Voto”, Pimentel Júnior, sugerem significantes e significados do voto para explicar o comportamento do eleitor. Os pesquisadores utilizam a variável emoção como principal vetor explicativo das escolhas eleitorais.
Considerando essas pesquisas, verifica-se se os sentimentos dos eleitores representam um “novo determinante do voto”. Nesse caso, os sentimentos são variáveis independentes, os quais possibilitam que eleitores façam as suas respectivas escolhas eleitorais. Os sentimentos têm a sua origem nas emoções. Mas nem todos os sentimentos provêm das emoções. Vale ressaltar aqui a força da comunicação profissional e profissionalizada, do marketing político e da propaganda aliando ainda mais peso e esforço para que o cidadão seja estimulado a sentir e expressar.
Emoção é um conjunto de alterações no estado do corpo associadas a imagens mentais que ativam um sistema cerebral específico. Portanto, a essência do sentir de uma emoção é a experiência dessas alterações. O sentimento, por sua vez, “são as percepções compostas daquilo que ocorre em nosso corpo e na nossa mente quando uma emoção está em curso” (DAMÁSIO)
Sobre o excesso de satisfação e estimulação, Lacan criticava o excesso das ideologias políticas que prometiam um desejo pleno, sem senso crítico ou debate.
Argumentava que isso era uma ilusão que levava à opressão e à alienação. Lacan também analisou o papel do líder político como um objeto de identificação para as massas, destacando o poder simbólico que eles exercem sobre os indivíduos. Em resumo, a perspectiva psicanalítica de Lacan sobre a política nos convida a refletir sobre a importância do “pensar e debater na política”.
Nossas identidades, desejos e relações sociais são moldados pelo discurso político e como o inconsciente influencia nossas crenças e comportamentos políticos. Tudo isso está presente em uma eleição municipal.
O filósofo contemporâneo Michel Foucault reconheceu, em suas análises da década de 1970, que política também significa uma ruptura entre o saber específico e o poder. Para Foucault, há tanto em Platão como em Sófocles resistência ao modelo social no qual o soberano detinha o poder da mântica, da justiça e da vida política. O que deve desaparecer, para ambos, é a imagem do rei sábio, que sustenta, governa, pilota, endireita a cidade e a livra da peste e da fome, e a sua versão rejuvenescida, o tirano, que salva a cidade, mas o faz desviando-se do oráculo dos deuses. A história edipiana é, portanto, a passagem do poder político ligado às transgressões e às lutas para o poder político entendido, desde então, como pureza, cegueira e ignorância.
O que faz a vereadora escolher aquela bandeira ou representar uma causa? E o que sugere um prefeito priorizar este ou aquele tema no orçamento público municipal? Decisões são políticas, e toda política é uma ação ideológica. Comunicação política é o que falamos, e o que silenciamos…Sim, o silêncio é um poder!
Maurício dos Santos é jornalista, especialista em Ciência Política e Mestre em Gestão de Políticas Públicas
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