Programa Universidade Gratuita: investimento social ou privatização do ensino superior? Estudo da Aprudesc levanta questionamentos

Governo do Estado gastou com o Programa Universidade Gratuita em 2024 o referente a 90% do orçamento destinado para a Udesc

Programa Universidade Gratuita: investimento social ou privatização do ensino superior? Estudo da Aprudesc levanta questionamentos

investimento do Governo de Santa Catarina no Programa Universidade Gratuita alcançou cifras expressivas em 2024, superando 90% do orçamento originalmente destinado para a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). No entanto, essa alocação financeira gerou inquietações e questionamentos levantados por um estudo da Associação dos Professores da Udesc (Aprudesc). A pesquisa sugere que o programa, lançado pelo governo Jorginho Mello em outubro de 2023, reflete uma escolha controversa: financiar mensalidades em universidades privadas e comunitárias com verba que poderia fortalecer a universidade pública estadual.

PROGRAMA UNIVERSIDADE GRATUITA: OBJETIVOS E APLICAÇÃO DE RECURSOS

A princípio, o Programa Universidade Gratuita surge com o propósito de ampliar o acesso ao ensino superior, subsidiando mensalidades em universidades privadas para estudantes de baixa renda. Em 2024, segundo dados da Secretaria da Educação (SED), o governo destinou R$ 471,4 milhões para o programa, valor que corresponde a 90% do orçamento da Udesc. O financiamento é direcionado para cursos de alto custo, como medicina, odontologia, direito e psicologia, que representam 43,6% das matrículas e absorvem 62,1% dos recursos.

Segundo o estudo da Aprudesc, o custo-aluno semestral médio nas universidades beneficiadas pelo programa é 16% superior ao custo por aluno na Udesc, levantando o debate sobre a eficiência do uso de recursos públicos para subsidiar cursos com mensalidades médias de até R$ 9,1 mil, no caso da medicina. Esses dados despertam questões importantes: o programa realmente democratiza o acesso à educação superior ou beneficia um perfil socioeconômico mais elevado, excluindo os mais vulneráveis?

CRITÉRIOS DE RENDA: ELITIZAÇÃO DO PROGRAMA?

O estudo também aponta críticas ao critério de renda para os beneficiários, sendo que a análise expõe uma disparidade quanto ao perfil socioeconômico e ao curso frequentado. De acordo com o critério de renda, estudantes de Medicina podem participar do programa se tiverem renda per capita de até 8 salários mínimos, enquanto alunos de outros cursos devem ter renda per capita de até 4 salários mínimos. Contudo, essa configuração é vista por economistas e especialistas como uma estrutura que beneficia estudantes de cursos de alta renda e que, muitas vezes, não enfrentam tantas barreiras financeiras para acessar o ensino superior. Cursos como Medicina, Direito, Psicologia e Odontologia dominam a lista de inscritos, representando 43,6% das matrículas e consumindo 62,1% dos recursos investidos no segundo semestre de 2024. Este dado leva a questionamentos sobre a inclusão e a democratização do programa, uma vez que o valor médio das mensalidades subsidiadas pode chegar a R$ 9.100,00 em cursos de Medicina, enquanto outros cursos custam, em média, R$ 3.800,00.

O economista Maurício Mulinari, responsável pelo levantamento, vê esses critérios como pouco inclusivos e enfatiza que a medida favorece estudantes de cursos tradicionalmente elitizados, como os já mencionados de medicina, direito e odontologia.

“O programa cria uma situação onde o investimento público não necessariamente atinge os mais vulneráveis, mas sim cursos de alta renda, concentrando benefícios em perfis socioeconômicos que não são os mais desassistidos”, aponta Mulinari. A crítica ressoa ainda mais quando se observa que o valor médio da mensalidade subsidiada em cursos de medicina é superior ao custo por aluno em cursos na Udesc, cuja missão é justamente atender a sociedade catarinense como um todo.

QUALIDADE DE ENSINO: COMPARAÇÃO ENTRE AS INSTITUIÇÕES BENEFICIADAS E A UDESC

A qualidade de ensino das instituições financiadas pelo programa também foi objeto de análise no estudo da Aprudesc. Usando dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) de 2022, o levantamento destaca que a Udesc obteve nota 3,9 no Índice Geral de Cursos (IGC), superando significativamente as instituições que recebem o financiamento da Universidade Gratuita, que registraram médias entre 2,35 e 3,39.

Esse diferencial de qualidade suscita uma questão fundamental: não seria mais vantajoso investir diretamente na Udesc, fortalecendo sua estrutura e oferta? O presidente da Aprudesc, Douglas Ladik Antunes, reforça essa ideia: “Os recursos destinados a universidades privadas poderiam alavancar a qualidade e o alcance da Udesc, que já possui estrutura estadualizada e atua com excelência no ensino, pesquisa e extensão”.

INVESTIMENTO NA UDESC: UMA SOLUÇÃO PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR PÚBLICA?

Para a Aprudesc, o investimento direto na Udesc não apenas potencializaria sua capacidade de ensino, como traria benefícios a longo prazo para o estado de Santa Catarina. “Ao fortalecer a Udesc, os recursos públicos ficam na rede de ensino do estado, contribuindo para a estrutura pública e retornando em forma de pesquisas, projetos de extensão e impacto direto na sociedade”, salienta Douglas Ladik Antunes.

Outro ponto é a própria condição da Udesc, que enfrenta desafios orçamentários e de pessoal. Douglas Ladik lembra que a universidade não realiza concursos públicos há vários anos e depende de investimentos para a valorização de seus profissionais e expansão de sua estrutura. A universidade é reconhecida por sua qualidade e relevância, estando atrás apenas da UFSC entre as instituições públicas de Santa Catarina, conforme o IGC do ENADE de 2022.

ACESSE O ESTUDO COMPLETO REALIZADO PELA ASSESSORIA ECONÔMICA DA APRUDESC

O FUTURO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR EM SANTA CATARINA

Com a análise da Aprudesc, surge uma reflexão mais ampla sobre o futuro do ensino superior em Santa Catarina. O governo estadual deve investir em um programa que, embora bem-intencionado, pode se tornar um mecanismo de transferência de recursos públicos para a esfera privada? Ou deve fortalecer instituições públicas como a Udesc, que têm uma contribuição comprovada para o desenvolvimento do estado?

As opções colocadas em pauta vão muito além de uma decisão financeira: dizem respeito a uma visão de sociedade e à compreensão de que o ensino superior público desempenha um papel vital na formação de cidadãos comprometidos com o desenvolvimento sustentável e inclusivo de Santa Catarina.


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Fonte
Assessoria de Imprensa da Aprudesc
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