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Reflexões de uma mulher brasileira da geração Y sobre o uso de tecnologias na educação

Em 2019 dei início ao Mestrado na UDESC, na Linha de Pesquisa “Educação, Comunicação e Tecnologia” e desenvolvi uma pesquisa sobre o uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) no Ensino Básico, cujos resultados apresentei em forma de dissertação no final de 2021.

Confesso que esta pesquisa somada às minhas experiências pessoais me deixaram tão impactadas que não consegui mais pensar sobre o tema durante um bom tempo, porque de fato a pesquisa somada à realidade me mostrou que as coisas são bem mais complexas do que eu imaginava. Mas neste início de 2025 resolvi superar alguns traumas e voltar a pesquisar e escrever sobre o assunto.

Para começar, resolvi publicar aqui no Conecta SC a íntegra da seção que mais gostei de escrever para a dissertação, que é a em que a do Memorial, onde descrevo minha história pessoal sobre o uso de tecnologias na educação e como cheguei à escolha do tema da pesquisa desenvolvida. Abaixo publicarei o texto na íntegra, acrescentando apenas tópicos que acredito que facilitarão a leitura do conteúdo.

MEMORIAL DA DISSERTAÇÃO “TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO BÁSICA: UM PANORAMA A PARTIR DA ANÁLISE DE ESTUDOS DE CASOS DO PROJETO UNESCO-FAZHENG”

 

A ERA PRÉ-DIGITAL: UMA EDUCAÇÃO ANALÓGICA

Esta pesquisa me fez refletir sobre minha história pessoal em relação à educação e às tecnologias. Sou filha de um casal que se conheceu dentro de uma escola, em um contexto educacional. Meu pai foi professor da minha mãe, enquanto ela cursava o magistério no segundo grau. Ele deixou de ser professor logo depois que eles se conheceram, mas minha mãe, mais tarde, se tornou professora e depois diretora em uma escola do município de São Bento do Sul, em Santa Catarina. Dessa forma, algumas das memórias mais remotas e importantes da minha vida são povoadas por professores, alunos e ambientes educacionais. 

Fui criança e adolescente em uma época em que a internet não fazia parte do dia a dia das pessoas. Enquanto nas primeiras décadas do século 21 nós temos acesso a conteúdos infindáveis por meio de vídeos do Youtube e de outros serviços de streaming, na minha infância, vivida nas duas últimas décadas do século 20, funcionavam apenas poucos canais na televisão. O telefone era um aparelho fixo, de uso compartilhado, disponível em empresas, lares e, também, na rua sob a forma de cabines públicas, conhecidas no Brasil como “orelhões”. As ligações, principalmente para outras cidades ou estados eram caríssimas. As pessoas costumavam ouvir discos de vinil, tirar fotos com câmeras de filme e mandar cartas escritas à mão pelos Correios. As cartas também podiam ser escritas em máquinas de escrever. Ah, quantos poemas em uma dessas eu escrevi! Naquela época, também, durante a minha adolescência, popularizaram-se na minha região, entre algumas famílias da classe média, as câmeras filmadoras. Lembro que pude ter acesso a estes equipamentos em situações muito pontuais para a realização de trabalhos de “jornalismo”, que nos eram dados na escola. A professora separava os alunos em grupos, que tinham que criar vídeos de forma livre. Algumas das melhores memórias que tenho da escola são dessas atividades. É uma pena que eu não tenha hoje acesso a nenhum daqueles vídeos, os quais foram feitos em câmeras emprestadas e cujas fitas se perderam. 

AS PRIMEIRAS TECNOLOGIAS NA SALA DE AULA

Pesquisar sobre o uso das TIC na educação, também me fez pensar sobre o quanto as tecnologias sempre estiveram presentes na minha vida como um todo e, também, na minha vivência escolar. Lembro que a professora do jardim de infância usava, por exemplo, um mimeógrafo para copiar as atividades que nos passava. Lembro também que nos dois primeiros colégios em que estudei havia uma sala com um aparelho de TV e videocassete que podia ser usada para os professores passarem filmes para os alunos. Na primeira escola eram usados livros didáticos e cadernos. Na segunda escola eram usadas apostilas. Em ambas, os alunos sentavam-se em carteiras, enfileirados, e o professor à frente usava o quadro negro e o livro didático ou a apostila como apoios. Houve um momento em que a segunda escola em que estudei instalou, ao lado da biblioteca, um laboratório de informática com computadores da Apple. Entretanto, pelo que lembro, este laboratório foi pouco utilizado em um período curto.

No terceiro ano do Ensino Médio, mudei de cidade e fui para Curitiba para estudar para o vestibular em um colégio em que os alunos também ficavam enfileirados e o professor à frente de todos tinha o quadro negro e apostilas como suporte. A diferença deste Colégio com o anterior, é que neste havia em torno de 300 alunos por turma e o professor ficava em um palco e talvez usasse um microfone, não tenho certeza, pois, infelizmente para mim, o tempo apagou da minha memória estes detalhes. Neste colégio, perto da cantina, havia uma sala na qual havia fitas cassetes com videoaulas que podiam ser alugadas pelos alunos, mas nunca tive condições de alugar nenhuma delas para saber se eram boas, por conta do custo elevado.

Parte da minha educação se deu fora da escola. Frequentei um projeto municipal de educação informal para crianças no contraturno, durante a infância, e, também, aulas de inglês, espanhol, datilografia e informática, em escolas especializadas, na adolescência. Boa parte da educação a que tive acesso na infância e na adolescência se deu, também, por meio de livros, discos, fitas cassetes e pela televisão. Eu era apaixonada pelos programas educativos da TV Cultura, e sinto que ter tido acesso à programação deste canal fez toda diferença na minha vida, influenciando muito em quem eu sou hoje.

TRANSIÇÃO PARA O ENSINO SUPERIOR: NOVOS DESAFIOS E TECNOLOGIAS

Entrei na universidade no ano 2000, aos 17 anos. Passei para o curso de Licenciatura em Educação Artística, com habilitação em Artes Plásticas, na Universidade Federal do Paraná (UFPR), curso que escolhi pois acreditava que por meio da arte e da educação eu poderia contribuir para uma sociedade melhor e mais justa. 

Naqueles primeiros anos do terceiro milênio eram poucos os que possuíam computadores pessoais e a disponibilidade da internet era limitada. Smartphones e videochamadas eram itens de ficção científica que não saberíamos se chegaríamos a experienciar. No ano de 2000, na UFPR, para todo o prédio de humanas, composto por 11 andares, havia apenas um laboratório de informática com uns dez computadores para serem usados de forma compartilhada por todos os alunos. 

No curso de Educação Artística não eram usados nem livros didáticos, nem apostilas. Havia uma sala de fotocópia, no qual os professores deixavam os textos que os alunos deveriam ler, depois de adquirir as cópias. A maior parte dos alunos usava um caderno universitário para fazer anotações. E como o curso que frequentei possuía habilitação em Artes Plásticas, outros suportes como papel, tela, tinta, madeira, metal, pedra entre outros também eram utilizados. O uso de retroprojetores com imagens coloridas, de vídeos e de livros também era uma realidade. Raramente se usava a internet como fonte de pesquisa para os trabalhos acadêmicos, pois o uso era realmente restrito. Desta forma, além das salas de aulas, a biblioteca era o principal local que eu costumava usar para expandir meu acesso à informação. E, neste aspecto, foi muito bom ter vivido em Curitiba naqueles anos. Além da biblioteca da UFPR, na qual trabalhei como estagiária no setor de periódicos, eu pude também frequentar a biblioteca da Prefeitura Municipal de Curitiba e a do Goethe Institut.  Essas três bibliotecas, além de livros, também emprestavam vídeos e a biblioteca do Goethe também empresava CDs. E na Biblioteca Municipal havia cursos de idiomas autoinstrucionais com fitas cassetes que podiam ser consumidos no local mediante agendamento. 

Foi também em Curitiba, no primeiro ano da licenciatura em Educação Artística, que tive meu primeiro emprego, na área da educação, como estagiária de um projeto da Fundação Cultural de Curitiba chamado “Linhas do Conhecimento”, onde atuei como arte-educadora por um ano. 

Infelizmente, por falta de recursos financeiros suficientes e sem estrutura para me manter sozinha em Curitiba, abandonei a universidade no terceiro ano, aos 19 anos, no ano de 2002. Num primeiro momento, voltei para a casa da minha mãe, em São Bento do Sul e depois segui rumo à Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina.  

O IMPACTO DAS TIC NAS MINHAS PRIMEIRAS EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS

Reflexões de uma mulher brasileira da geração Y sobre o uso de tecnologias na Educação
Foto: Rick Gomez

Depois de passar um breve período trabalhando como garçonete, comecei a trabalhar de assistente de um fotógrafo norte-americano, que foi um dos pioneiros da fotografia digital e que possuía dois computadores Macintosh de última geração, um desktop e um laptop. Aquele desktop G4 foi o primeiro computador que eu usei profissionalmente. E foi também o primeiro computador que eu tive na vida, pois, quando o fotógrafo voltou para os Estados Unidos ele deixou o computador comigo, para que eu pudesse continuar trabalhando. Ele me mandava os arquivos fotográficos pela internet, via FTP, eu os tratava no Photoshop e depois de tratados, eu os enviava de volta.

ENSINO A DISTÂNCIA COMO REVOLUÇÃO PESSOAL

Neste meio tempo, os computadores pessoais e a internet foram se tornando cada vez mais populares e o mundo foi ficando cada vez mais digital e interconectado. Fato é que o tempo passou, mas não passou a vontade e a necessidade que eu tinha de ter um diploma universitário. Por isso, vibrei quando no ano de 2006 recebi a divulgação do curso de graduação em Multimídia Digital, oferecido na modalidade a distância pela Unisul Virtual. Naquele momento o ensino a distância (EAD) em cursos de graduação era uma novidade que prometia maior flexibilidade de horários do que os cursos presenciais, possibilitando que pessoas que trabalhavam em período integral pudessem ter um diploma, e como eu sempre gostei de novidades e de novas tecnologias, não tive dúvidas e prontamente me matriculei. 

PAIXÃO PELO USO DE TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO

O universo do ensino mediado pelas TIC me fascinou, tanto que após me formar, me profissionalizei como designer instrucional e assessora de comunicação e trabalhei em diversos projetos de educação e e-learning em diferentes empresas de Florianópolis. E desde então, nunca parei de pensar em como as tecnologias podem ser utilizadas a favor da educação e tenho trabalhado ao máximo para contribuir com a área.

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Foto: arquivo pessoal

Posteriormente, em 2014, dei início a uma pós-graduação em Jogos Digitais e avancei na compreensão de como os games podem ser utilizados na educação, principalmente na educação infantojuvenil. Minha defesa é a de que podemos usar os recursos dessas mídias com as quais as crianças e os adolescentes têm tanta atração para potencializar a aprendizagem de conteúdos escolares e fazer isso em larga escala.

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Foto: Arquivo pessoal

Meus estudos relacionados ao universo dos jogos digitais me levaram a ser professora no SENAI Florianópolis, onde fui contratada como horista, em 2014. Portanto, pude exercitar a prática docente, durante alguns anos, em uma instituição na qual todas as salas de aula disponibilizavam um computador por aluno, um computador para o professor, projetor, lousa branca, canetões, apagador, caixas de som e rede de internet e assim vivi a experiência de ser professora em um contexto tecnologicamente privilegiado em relação à maior parte das instituições escolares brasileiras.

MESTRADO DURANTE A PANDEMIA

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Foto Arquivo Pessoal

Mais tarde, em 2019, fui aprovada no Mestrado em Educação, na UDESC, na Linha de Educação, Comunicação e Tecnologia. Meu projeto inicial era fazer uma pesquisa que trabalhasse a relação entre os temas: mídias digitais e desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Com a evolução da proposta inicial, este projeto caminhou em direção à uma pesquisa ligada ao Programa Um por todos e todos por um, o qual tem como objetivo levar o ensino de ética e cidadania para as escolas brasileiras de Ensino Fundamental, com o apoio dos personagens da Turma da Mônica. Entretanto, tive que abandonar este projeto, pois o programa em questão foi diretamente impactado pelo fechamento das escolas, que aconteceu por causa da Pandemia de Covid-19. A mudança de rota teve que ser rápida, pois eu já estava indo para o segundo ano do curso do mestrado e o fator prazo precisava ser observado com atenção. Desta forma, optei por realizar uma análise de conteúdo de estudos de casos publicados pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), os quais trazem relatos de experiências de diferentes países sobre a integração das TIC na educação, de forma a ter uma compreensão ampla sobre este tema. 

DA TEORIA À PRÁTICA: VISÃO COMERCIAL E SOCIAL SOBRE O USO DAS TIC NA EDUCAÇÃO

Durante o período em que realizei esta pesquisa, tive dois serviços que contribuíram de forma direta para a minha compreensão sobre o uso das TIC na educação.

VISÃO COMERCIAL E SOCIAL SOBRE O USO DAS TIC NA EDUCAÇÃO

Em um deles, no primeiro semestre de 2021, atuei como consultora educacional, vendendo plataformas digitais, jogos educacionais e formação de professores para o uso das TIC e desta forma, pude conversar sobre o meu tema de pesquisa com diversos profissionais da educação como coordenadores pedagógicos, professores, secretários de educação, responsáveis por projetos de tecnologias educacionais, entre outros, o que ampliou minha visão a partir de relatos vivenciados por estas pessoas.

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Foto: arquivo pessoal

E no período final do curso de mestrado, voltei à sala de aula, como educadora social e professora de informática, atendendo alunos de 6 a 17 anos no contraturno escolar em um projeto social em Florianópolis, o que me permitiu sentir na prática a relação destes alunos com as TIC e compreender o quanto ainda há muito a ser trabalhado de forma a diminuir a distância entre as teorias e a realidade. 

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Foto: arquivo pessoal

SEGUINDO EM FRENTE, COMPROMETO-ME A RETOMAR AS REFLEXÕES SOBRE O USO DE TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO

Parar por um tempo foi essencial para assimilar tudo o que vivi e pesquisei, além de lidar com outros desafios que surgiram após a defesa da dissertação. No entanto, a importância do tema nunca deixou de ressoar em mim, e agora, com um novo olhar e renovado entusiasmo, retomo as reflexões sobre o uso das tecnologias na educação.

Atualmente, um dos debates mais acalorados dentro do ambiente escolar e entre os formuladores de políticas educacionais gira em torno do uso pedagógico dos celulares em sala de aula. Em diversos países e estados brasileiros, há discussões sobre proibir ou regulamentar o uso desses dispositivos no ambiente escolar, e essa polarização levanta questões cruciais: os celulares são aliados ou inimigos da aprendizagem? Como podemos potencializar seus benefícios e minimizar os prejuízos?

Diante desse cenário, vejo como fundamental trazer minha experiência e meus estudos para contribuir com esse debate. Quero explorar diferentes perspectivas, compartilhar boas práticas e discutir como podemos equilibrar inovação tecnológica e qualidade educacional. Assim, inicio este novo ciclo de reflexões, trazendo à tona questionamentos e propostas que possam ajudar a construir caminhos mais eficazes para a integração das tecnologias digitais na educação.

Fonte: CANTO, Francine. Tecnologias da Informação e da Comunicação na educação básica: um panorama construído a partir da análise de estudos de casos do projeto UNESCO-Fazheng / Francine Canto. — 2021. 108 p.

 

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