Em 15 de dezembro, Chico Mendes completaria 80 anos, se sua vida não tivesse sido interrompida em 22 de dezembro de 1988, aos 44 anos, com um assassinato brutal a tiros de escopeta em sua casa em Xapuri, no Acre. Localizado no coração da Amazônia, Xapuri foi o cenário onde o sindicalista e ativista dedicou sua vida à defesa das pessoas e do meio ambiente, especialmente dos seringueiros e da floresta que ele tanto amava.
“Se a gente for olhar pela trajetória de vida do meu pai, com seus 44 anos, jovem e atravessado por tantos desafios, tendo tantas ideias e liderando processos tão complexos e ousados para a época, se estivesse vivo, eu veria hoje uma Amazônia um pouco melhor de se viver, uma Amazônia mais preservada”, reflete Ângela Mendes, filha de Chico com sua primeira esposa, Eunice Feitosa Mendes.
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UMA VIDA CURTA, MAS REPLETA DE LUTA
Nascido em Xapuri, Francisco Alves Mendes Filho construiu uma trajetória marcada por desafios e superação. Cresceu em condições difíceis, trabalhando desde os 11 anos no Seringal Porto Rico, onde teve poucas oportunidades de estudar. Porém, foi aos 16 anos que Chico foi alfabetizado por Euclides Távora, um militante comunista cearense que havia se refugiado na região devido à perseguição política do governo Getúlio Vargas.
Com o acesso ao conhecimento, Chico Mendes não apenas mudou sua própria vida, mas também inspirou e liderou outros seringueiros e trabalhadores rurais. “O próprio Chico dizia, eu pensei primeiro que estava defendendo a seringueira, depois os seringueiros, depois a floresta, e por fim, percebi que estava defendendo o planeta. Eu estava lutando pelo planeta”, lembra Gumercindo Rodrigues, o Guma, amigo e também militante.
O ‘EMPACTO’ E AS PRIMEIRAS CONQUISTAS
Uma das estratégias iniciais de resistência adotadas por Chico Mendes foi o “empate”, uma ferramenta pacífica criada pelo seringueiro Wilson Pinheiro. A ideia consistia em reunir o maior número possível de trabalhadores e suas famílias para se posicionar contra os desmatadores, bloqueando suas ações. “Essa prática se tornou bastante forte na região de Brasileia (AC) e foi conduzida com maestria por Wilson Pinheiro, que foi assassinado em 1980 por sua capacidade de mobilização”, lembra Guma.
ALIANÇAS E NOVAS FERRAMENTAS DE MOBILIZAÇÃO
Na década de 1980, Chico Mendes impulsionou a criação da Aliança dos Povos da Floresta, uma iniciativa que uniu extrativistas, indígenas, ribeirinhos e outros povos tradicionais em prol da preservação ambiental. Também foi fundamental na fundação do Conselho Nacional dos Seringueiros e na concepção das Reservas Extrativistas (Resex), que protegiam os territórios e permitiam o uso sustentável dos recursos naturais.
De acordo com Ângela Mendes, a proposta de regularização das áreas onde os seringueiros viviam contribuiu para estabelecer uma relação harmoniosa com a floresta. “Hoje está mais do que provado que as populações tradicionais têm uma relação única com seu território, sendo guardiões da floresta e de sua ancestralidade”, afirma.
UM LEGIADO DE INSPIRAÇÃO E SOLIDARIEDADE
A experiência de alfabetização tardia vivida por Chico Mendes inspirou a criação do Projeto Seringueiro, que levou escolas aos seringais com uma metodologia de ensino para adultos baseada nas ideias de Paulo Freire. A iniciativa, que contou com a liderança da antropóloga Mary Allegretti, ganhou força com o apoio do Centro de Trabalhadores da Amazônia.
Para Ângela, o legado de seu pai é mantido vivo pelas pessoas que conviveram com ele. “Ele era uma pessoa intensamente carismática, que inspirava confiança e fraternidade. Ele não tinha limites quando se tratava de ajudar aos outros”, recorda.
O PREÇO DA PARTIDA PRECOCE
O amigo e militante Guma acredita que a morte de Chico Mendes foi um golpe duro para a luta ambiental. “Ele era um porta-voz extremamente eficiente, tranquilo e firme nas suas posições. Eu acho que ele teria conseguido aglutinar ainda mais pessoas nessa resistência”, afirma.
Guma, que virou advogado para apoiar os povos da floresta, também defende um novo modelo de desenvolvimento para a Amazônia. “O Brasil precisa atingir o desmatamento zero em todos os biomas. A responsabilização civil é a melhor punição para quem causa danos à natureza. Desmatou mil hectares? Tem que plantar dois mil hectares de florestas nativas”, destaca.
O LEGADO VIVO DE CHICO MENDES
Para Ângela Mendes, o legado deixado por seu pai é fundamental para a preservação da Amazônia e a proteção das populações tradicionais. “É preciso cuidar do futuro e manter tudo o que Chico Mendes construiu vivo. Olhamos para a juventude desses territórios porque o jovem é o presente e o futuro. Para garantir que os territórios permaneçam protegidos, precisamos garantir o acesso a direitos e políticas públicas que tragam bem-estar para as pessoas nesses lugares”, conclui.
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